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por Fernando Moreira de Souza
Infográficos: Matheus Pigozzi / Agência Pública
Reportagem de Alice Maciel na Agência Pública apurou que dois aliados próximos do ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira (PSD-MG), passaram a atuar no ramo da mineração em Minas Gerais após sua nomeação para o cargo, em janeiro de 2023. Segundo a Pública, trata-se do primo e sócio Cláudio Lúcio de Magalhães Silveira Júnior e do advogado José Júlio Costa Neto. Ambos já haviam mantido vínculos empresariais com o ministro no setor imobiliário e expandiram suas atividades para a mineração depois que Silveira assumiu o comando do Ministério de Minas e Energia (MME).
Poucos meses após a posse, Cláudio Silveira Júnior assumiu a direção de duas mineradoras: a Belcs Mineração S/A, em março de 2023, e a RS Mineração Ltda., em maio de 2024. A Belcs, criada no mesmo ano, obteve autorização da Agência Nacional de Mineração (ANM) para realizar pesquisa de diamantes em Guarda Mor (MG). A concessão foi destacada em reportagem da Folha de S. Paulo.
Por sua vez, a RS Mineração recebeu, ainda em novembro de 2022 — durante o período de transição entre os governos de Jair Bolsonaro (PL) e Luiz Inácio Lula da Silva (PT) — uma licença para extrair minério de ferro em uma área de 97,6 hectares no município de Ouro Preto (MG).

Empresas e relações cruzadas
Em outra frente, o advogado de Silveira, José Júlio Costa Neto, obteve permissão da ANM em maio de 2024 para investigar a presença de minério de ferro em um terreno de 996 hectares localizado em Caratinga (MG), cidade natal do ministro. Costa Neto administrou, entre setembro de 2021 e dezembro de 2022, a empresa Alternativa para Todos Participações e Empreendimentos — fundada por Silveira, que ainda consta como sócio no registro da companhia.

Essa mesma empresa também integra o quadro societário da Olhos D’Água Pará de Minas Ltda., que tem como sócia a Construtora CCS Ltda., representada por Cláudio Silveira Júnior. Assim, além do vínculo familiar, Cláudio Júnior mantém sociedade com o ministro em empreendimentos comerciais.
Já no exercício do cargo, Alexandre Silveira participou, em 30 de agosto de 2023, de uma reunião com os dirigentes da Alternativa para Todos. A pauta tratava da autorização para venda de bens imóveis. A ata da reunião foi registrada na Junta Comercial de Minas Gerais, cujos dados foram analisados pela Agência Pública para apurar as conexões empresariais entre o ministro, seu primo e seu advogado.

Procurado, o Ministério de Minas e Energia não negou a sociedade entre Silveira e Cláudio Júnior, mas afirmou que o ministro nunca foi sócio do primo em atividades ligadas à mineração ou a setores relacionados à pasta. Em nota oficial, o ministério declarou que Alexandre Silveira “nunca manteve negócios nesses segmentos”, negou qualquer interferência na ANM e assegurou que tanto sua atuação quanto a do ministério “seguem estritamente os preceitos legais”.
Sobre o pedido de pesquisa mineral feito por Costa Neto, o MME alegou que o ministro só teve conhecimento do caso após os questionamentos feitos pela Agência Pública.

Alexandre Silveira é ministro de Minas e Energia do terceiro governo do presidente Lula desde o início do mandato do petista / Foto: Valter Campanato – Agência Brasil
A ANM, por sua vez, informou que, embora vinculada ao MME, mantém independência administrativa e técnica. Reforçou ainda que sua atuação é pautada pela legalidade, impessoalidade e total transparência, e que os processos são públicos, seguem critérios objetivos e estão livres de qualquer tipo de influência externa ou pessoal.
Conexões políticas e atuação empresarial
O Ministério de Minas e Energia (MME) negou qualquer interferência do ministro Alexandre Silveira em processos em andamento na Agência Nacional de Mineração (ANM). A informação foi reforçada à Agência Pública pelo advogado José Costa Neto e por Cláudio Silveira Júnior, primo do ministro. Ambos destacaram que não possuem vínculos societários com o titular da pasta em atividades relacionadas ao ministério.
Documentos da Junta Comercial de Minas Gerais mostram que Cláudio Silveira Júnior passou a integrar a RS Mineração em novembro de 2022, representando a holding CSJR Participações. Em março de 2023, dois meses após Alexandre Silveira assumir o MME, foi criada a Belcs Mineração, também ligada à mesma holding.
Até maio de 2024, a CSJR detinha 20% das ações da Construtora Ambientalmente Sustentável (CAS), enquanto os outros 80% pertenciam à Solidez Participações, empresa controlada por Alexandre Silveira e presidida por sua filha, Maria Luiza Fujishima Silveira.
Conforme reportado pelo UOL, o ministro foi denunciado pelo Ministério Público de Minas Gerais (MPMG) em 2019 por suposto uso indevido de influência para favorecer a CAS, representada por Cláudio Silveira Júnior. Em 2021, um acordo extrajudicial foi firmado com o MPMG e, segundo a instituição, as condições foram cumpridas integralmente. Detalhes adicionais permanecem sob sigilo judicial.O UOL também revelou que os bens do ministro e de suas empresas somam R$ 79,1 milhões. Além disso, a declaração de conflito de interesses apresentada ao assumir o cargo foi colocada sob sigilo de 100 anos pelo governo federal.









Em nota enviada à Pública, o MME afirmou não haver conflito de interesse nos casos mencionados. Segundo a pasta, o grau de parentesco entre Alexandre Silveira e Cláudio Silveira Júnior — quarto grau — não está entre os previstos pela Lei nº 12.813/2013 como impeditivos. Cláudio reafirmou que o vínculo familiar não caracteriza impedimento legal, enquanto o advogado José Costa Neto alegou que o pedido de pesquisa apresentado por ele está dentro da legalidade.
Além das relações familiares e profissionais, os três envolvidos compartilham uma trajetória política. Em 2012, integraram a comissão provisória municipal do PSD em Belo Horizonte, ao lado do empresário Henry Rodrigo de Paula Lopes, atualmente administrador da RS Mineração.
Dados do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) indicam que o pai de Cláudio Júnior, Cláudio Lúcio de Magalhães Silveira — tio do ministro — foi o maior doador da campanha de Silveira ao Senado em 2022, com R$ 530 mil. Já a coordenação financeira ficou a cargo de José Costa Neto, que recebeu R$ 15 mil. O advogado também atuou como assessor parlamentar do ministro e o representa em ações judiciais, incluindo um processo em curso no Tribunal de Contas da União (TCU) desde 2006.
Licenciamento ambiental sob questionamento
Entre os três processos minerários ligados a aliados de Alexandre Silveira, o da RS Mineração é o mais adiantado na ANM. Desde maio de 2024, a empresa opera na Serra do Botafogo, em Ouro Preto (MG). A entrada de Cláudio Silveira Júnior no empreendimento coincidiu com o avanço do processo na agência reguladora.
Segundo apuração da Pública, a licença ambiental da RS Mineração foi emitida em agosto de 2022 e classificada como “prioritária” pela secretária estadual de Meio Ambiente, Marília Carvalho de Melo. Em mensagem obtida pela reportagem, a secretária solicitou agilidade na análise do licenciamento, mencionando o deputado estadual Gil Pereira (PSD), aliado de Silveira, como demandante.
Em resposta, o deputado confirmou o pedido e afirmou que se tratava de um procedimento comum no exercício de seu mandato, dentro dos parâmetros legais.
A autorização ambiental da RS Mineração foi assinada por Charles Soares de Souza, então superintendente regional da Semad e policial militar investigado pelo MPMG por supostamente favorecer mineradoras na Serra do Curral. A reportagem não conseguiu contato com o ex-superintendente. O espaço permanece aberto para sua manifestação.
A Semad declarou, em nota, que todos os processos seguem critérios técnicos e legais, e que solicitações de parlamentares fazem parte da rotina administrativa. A análise do processo da RS Mineração durou 25 meses, segundo a pasta.
O MME informou que Alexandre Silveira não tem envolvimento com decisões do governo estadual e negou qualquer articulação do ministro junto ao deputado Gil Pereira. Já Cláudio Silveira Júnior afirmou que todas as atividades da empresa ocorreram dentro da legalidade e sem interferência de servidores públicos.
Outros seis projetos minerários também avançaram na Serra do Botafogo em 2024. O crescimento simultâneo de empreendimentos de menor porte na região despertou preocupação entre moradores e especialistas. Uma audiência pública foi realizada na Assembleia Legislativa de Minas Gerais, e um estudo conduzido por alunos da Universidade Federal de Ouro Preto apontou que os projetos são fragmentados intencionalmente para facilitar o processo de licenciamento ambiental.

Segundo as professoras Ana Paula Silva de Assis e Karine Gonçalves Carneiro, responsáveis pela orientação do estudo, a fragmentação permite que cada projeto apresente exigências ambientais reduzidas, o que favorece sua aprovação. Elas alertam que essa estratégia pode servir para grandes mineradoras utilizarem empresas menores como intermediárias.
O relatório produzido pela universidade destaca que os impactos acumulados dos projetos colocam em risco os recursos hídricos, o turismo, o patrimônio histórico e o equilíbrio ambiental da região, especialmente diante da atual crise climática.