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por Fernando Moreira de Souza
O Conselho Nacional de Política Indigenista (CNPI) aprovou, durante sua terceira reunião ordinária em Brasília, realizada na sexta-feira (9), uma resolução que recomenda ao Congresso Nacional e ao Supremo Tribunal Federal (STF) que não avancem em propostas de regulamentação da mineração em Terras Indígenas. O documento enfatiza que qualquer iniciativa nesse sentido deve respeitar o direito à consulta prévia, livre e informada dos povos indígenas, conforme previsto na Convenção nº 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), ratificada pelo Brasil em 2004.
A ministra dos Povos Indígenas e presidenta do CNPI, Sonia Guajajara, destacou a gravidade dos impactos da mineração em áreas indígenas. “A atividade garimpeira e minerária nas terras indígenas e em seu entorno causa danos sociais, ambientais e econômicos irreparáveis. A extração ilegal de minérios é um dos principais desafios enfrentados nas operações de desintrusão atualmente em curso, que contam com a atuação de pelo menos 30 ministérios”, afirmou.
Além disso, o CNPI solicitou a suspensão imediata das atividades do Grupo de Trabalho do Senado Federal, criado em 2025, que tem por objetivo formular propostas legislativas para regular a pesquisa e exploração mineral em Terras Indígenas. De acordo com o Conselho, o grupo não respeita os dispositivos da Convenção da OIT nem garante participação efetiva do CNPI nas discussões.
A resolução também direciona um apelo ao STF para que reconheça que o artigo 231 da Constituição Federal não impõe ao Legislativo a obrigação de regulamentar a mineração em terras indígenas, sendo essa apenas uma possibilidade — e condicionada à consulta aos povos afetados.
Em março deste ano, o ministro do STF Flávio Dino acatou um Mandado de Injunção (MI 7490) e reconheceu a omissão do Congresso Nacional em regulamentar dispositivos constitucionais que garantam aos povos indígenas participação nos lucros gerados por empreendimentos como hidrelétricas instaladas em seus territórios. A decisão estabeleceu um prazo de 24 meses para que o Legislativo regulamente esses direitos.
A liminar está relacionada diretamente aos impactos da Usina Hidrelétrica de Belo Monte (UHBM), no Pará. De acordo com o despacho do ministro, enquanto não houver norma específica, as comunidades afetadas devem ter assegurado o direito à participação nos resultados da exploração. A medida também deverá ser aplicada a outros empreendimentos que utilizem recursos hídricos em áreas indígenas.
Segundo a Constituição Federal, o artigo 231 reconhece aos povos indígenas os direitos originários sobre as terras que tradicionalmente ocupam, garantindo a posse permanente e o usufruto exclusivo dos recursos naturais existentes nessas áreas. A exploração mineral e hídrica só pode ocorrer com autorização do Congresso Nacional e mediante consulta às comunidades impactadas.
Retomada e composição do CNPI
Reativado em 2024 após mais de cinco anos de inatividade, o CNPI voltou a funcionar por meio do decreto presidencial nº 11.509/2023. O colegiado é formado por 64 membros: 30 representantes dos povos indígenas, 30 do poder público e quatro de organizações indigenistas.
Sonia Guajajara e Dinamam Tuxá, da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib), foram eleitos, respectivamente, como presidenta e vice-presidente do Conselho para o atual ciclo de gestão. A composição indígena foi definida em uma série de encontros regionais promovidos entre novembro de 2023 e abril de 2024, no âmbito da caravana “Participa, Parente!”, organizada pelo Ministério dos Povos Indígenas (MPI) e pela Apib.
A primeira reunião ordinária do CNPI ocorreu em abril deste ano, no Palácio da Justiça, em Brasília. A segunda foi realizada no Palácio do Itamaraty, em agosto. A terceira e última reunião do ano consolidou os debates sobre os principais desafios enfrentados pelos povos indígenas no Brasil, incluindo a mineração em seus territórios.
Histórico do Conselho
A criação do CNPI foi uma das principais reivindicações do Acampamento Terra Livre (ATL), que completou 20 anos em 2024. Em 2006, o governo federal instituiu a Comissão Nacional de Política Indigenista, com a missão de elaborar uma proposta de criação do Conselho. Essa Comissão funcionou até 2009 e participou da formulação de políticas fundamentais, como a Política Nacional de Gestão Territorial e Ambiental de Terras Indígenas (PNGATI), instituída em 2014.
A versão atual do CNPI foi criada em 2015, por decreto da então presidenta Dilma Rousseff, mas sua atuação foi interrompida após a mudança de governo em 2016. Durante os anos seguintes, diversas políticas públicas voltadas aos povos originários foram desmontadas ou enfraquecidas, conforme apontam lideranças indígenas.
Agora, com a retomada do CNPI, o movimento indígena busca fortalecer sua representação institucional e assegurar que seus direitos constitucionais sejam respeitados em todas as esferas do Estado.
Fonte: Ministério dos Povos Indígenas