por Fernando Moreira de Souza
O banco de dados, compilado pela AidData, do College of William & Mary, nos Estados Unidos, demonstra como Pequim empregou uma complexa estrutura de instrumentos financeiros para dominar a cadeia produtiva global de minerais críticos. Esses recursos — como cobre, cobalto, níquel, lítio e elementos de terras raras — são indispensáveis para tecnologias emergentes, incluindo baterias de veículos elétricos e painéis solares.
Entre 2000 e 2021, entidades financeiras chinesas concederam aproximadamente US$ 57 bilhões em financiamentos para 19 países de renda baixa e média, segundo o relatório. Um estudo complementar, intitulado Power Playbook: Beijing’s Bid to Secure Overseas Transition Minerals, detalha 93 acordos de crédito e uma doação, envolvendo 86 credores — uma combinação de instituições chinesas e estrangeiras — destinados a 59 beneficiários.
Ambos os levantamentos evidenciam como a China mobilizou suas vastas reservas cambiais para garantir domínio prolongado sobre jazidas estratégicas em países ricos em recursos naturais. Entre os exemplos mais relevantes estão o cobre e o cobalto da República Democrática do Congo e do Peru, o níquel da Indonésia e o lítio da Argentina.
Mais de 75% desses aportes foram estruturados para assegurar participação acionária chinesa, majoritariamente por meio de joint ventures (JVs) e veículos de propósito específico (SPVs). Esses modelos de investimento conferem às empresas chinesas uma posição privilegiada na extração e no beneficiamento desses insumos.
O relatório também sublinha uma diferença essencial entre a estratégia de financiamento mineral da China e sua principal iniciativa de infraestrutura global, a Iniciativa do Cinturão e Rota (BRI), promovida pelo presidente Xi Jinping.
Ao contrário dos financiamentos da BRI, tradicionalmente concedidos por um número restrito de bancos de desenvolvimento chineses, o financiamento para minerais de transição envolve uma gama mais ampla de instituições credoras, incluindo bancos comerciais estatais, como o Industrial and Commercial Bank of China, o Bank of China e o Citic.
O levantamento aponta que os empréstimos para o setor mineral frequentemente são estruturados em cadeias sucessivas, em vez de acordos isolados, indicando um compromisso mais profundo e prolongado para garantir o suprimento desses recursos essenciais. Segundo a AidData, quase 25% dos créditos concedidos nesse segmento contaram com garantias de fiadores chineses — um contraste significativo com a taxa estimada de apenas 4% para os projetos gerais da BRI.
As conclusões do relatório estão alinhadas com diversas análises recentes, incluindo um artigo publicado pela The Economist, que revelou que, em 2023, empresas chinesas investiram cerca de US$ 16 bilhões em operações de mineração no exterior — o maior montante em uma década, superando os menos de US$ 5 bilhões registrados no ano anterior.
O estudo também levanta preocupações sobre os impactos para os países anfitriões. Em dois terços dos casos analisados, as JVs e SPVs limitaram significativamente a participação governamental local, o que, por um lado, reduz os passivos financeiros dessas nações, mas, por outro, restringe sua capacidade de obter retornos financeiros futuros da exploração mineral.
As descobertas da AidData evidenciam a abordagem meticulosa de Pequim para assegurar acesso a recursos essenciais, enquanto outras economias enfrentam o risco de ficarem para trás na corrida por esses insumos estratégicos.
Diante do crescente escrutínio sobre essas estratégias, o relatório também ressalta as implicações geopolíticas mais amplas do protagonismo da China no setor mineral. Além disso, levanta questões urgentes para os países em desenvolvimento sobre como equilibrar os benefícios dos investimentos chineses com a necessidade de preservar a soberania sobre seus recursos naturais.
fonte: Mining.com