por Fernando Moreira de Souza
Uma das metas contidas na iniciativa lançada em janeiro pelo governo federal para retomar a industrialização no país, a Nova Indústria Brasil (NIB), é garantir que até 2026, ao menos 3% dos veículos elétricos em circulação tenham baterias nacionais e a estimativa é que esse percentual cresça ainda mais em 2033, alcançando um terço dos carros. Mas a meta, embora positiva, é pouco ambiciosa na avaliação de Ana Cabral, Co-Chairperson e CEO da Sigma Lithium.
“Acho incrível fazer baterias aqui, mas a oportunidade é muito maior do que o nosso próprio mercado doméstico”, afirmou, durante painel do Fórum Infraestrutura Cidades e Investimento, realizado pela EXAME, que debateu a descarbonização no transporte e o papel dos minerais críticos, na terça-feira, 10, quando destacou que esse processo de descarbonização envolve 18 elos de cadeia produtiva de interesse de todo o mundo.
O país reúne as condições necessárias para ter protagonismo global, como resiliência, – com linhas diversificadas de produção –, segurança jurídica, abundância de recursos, energia renovável limpa e barata, leis trabalhistas e regras ambientais. “Hoje, 88% dos carros de passageiros circulando no Brasil, são flex. Essa é uma forma industrial feita para uma oportunidade ímpar que temos para virar uma grande catapulta de exportação de materiais industrializados a partir da indústria de base. E nós, aqui no Brasil, temos a oportunidade de entregar um material que pode ser carbono neutro. Estamos falando aqui de uma plataforma exportadora”, defendeu.
“Somos amigos da China, dos Estados Unidos, Europa, de todo mundo. Aqui todo mundo é bem-vindo, então você tem como ser o receptáculo dos investimentos de todos para abastecer o mundo inteiro”, garante Ana Cabral.
Isso porque enquanto a China produziu 58% de todos os carros sem motor a combustão fabricados no mundo para atender o consumo doméstico, houve um arrefecimento da demanda por veículos elétricos no hemisfério norte. “A ironia é que as grandes empresas de tech no valor de um trilhão, que estavam na dianteira de chegarem ao carbono neutro antes das indústrias pesadas de base, andaram para trás nas suas metas climáticas por conta das instalações de data centers. Dependendo de onde estavam, eles usavam energia de carvão”, explica.
Competitividade
Agência Internacional de Energia (IEA, em inglês) prevê que até 2028 metade do incremento da oferta de biocombustível do mundo virá do Brasil, com as vantagens competitivas nacionais, no campo do biocombustível.
Através de medida utilisada para comparar emissões de diferentes gases do efeito estufa, um levantamento produzido pela Unica(União da Indústria de Cana-de-Açúcar) apontou que o uso do etanol resultou em uma redução de emissões de 535 milhões de toneladas de CO2eq, entre 2003 e 2019.
De acordo com a CNI, o Brasil precisa melhorar o balanceamento da matriz de transporte, muito dependente dos caminhões, que têm uma proporção de emissão de gases poluentes de duas a três vezes maior em relação as ferrovias e quatro vezes a do transporte marítimo de cabotagem.
Ramon Goulart Cunha, especialista em infraestrutura da CNI, aponta para o preparo da indústria na descarbonização do setor de transporte, onde existe um desafio enorme e o Brasil precisa utilizar suas vantagens comparativas para que seja possivel encarar essa janela de oportunidade.
O Brasil é a aposta da Toyota
Um levantamento da Agência Internacional de Energia, mostra que somente o transporte rodoviário, em sua maioria, é composto por veículos leves, respondendo por 15% do total de emissões, um desafio também para a indústria automobilística.
A Toyota vem apostando no mercado nacional e no crescimento da tecnologia híbrida para o Brasil e para a exportação, desde 1958. A montadora produz hoje no país dois modelos híbridos e anunciou recentemente um investimento de R$ 11 bilhões de reais para fabricar mais dois veículos híbridos flex no Brasil. O modelo híbrido também será exportado para o Paraguai, que tem etanol disponível nas bombas de combustível, e vai chegar a outros 21 países na versão gasolina.
O Brasil é um dos principais produtores de veículos na América Latina e um candidato natural para exportar essas tecnologias, de acordo com Roberto Braun, diretor de comunicação da Toyota e presidente da Fundação Toyota no Brasil. 20% do etanol aqui produzido vem do milho e isso está crescendo.
Ana Cabral adverte para a existencia de outros mercados investindo na indústria verde e o Brasil não pode perder tempo. “Cavalo selado, quando passa, temos que subir nele. Porque uma série de outros países que reúnem essas condições e estão fazendo um trabalho incrível. Temos que caminhar para uma transição justa”, afirmou.