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por Fernando Moreira de Souza
Uma jazida de terras raras localizada sobre um vulcão extinto no Sul de Minas Gerais pode alçar o Brasil a protagonista global na cadeia da transição energética. Com cerca de 750 km², a Caldeira de Poços de Caldas abrange quatro municípios e apresenta características geológicas que tornam a extração dos elementos competitiva frente à produção chinesa, que domina o mercado desde os anos 1990.
Os chamados elementos de terras raras — um grupo de 17 metais estratégicos — são insumos fundamentais na fabricação de tecnologias de energia limpa, como turbinas eólicas, veículos elétricos e baterias. Apesar de amplamente distribuídos na crosta terrestre, sua separação mineralógica é complexa, o que justifica o nome.
Com 21 milhões de toneladas em reservas, o Brasil detém cerca de 23% das reservas globais, segundo o Ministério de Minas e Energia (MME). Projetos de mineração já foram iniciados em Goiás e Minas Gerais, com mapeamentos também em estados como Amazonas, São Paulo e Roraima.

Poços de Caldas: viabilidade técnica e econômica inédita
A jazida mineira se destaca não apenas pela extensão, mas pela concentração de óxidos de terras raras na argila superficial — resultado da erosão de rochas alcalinas formadas há cerca de 120 milhões de anos. Estudos apontam teores médios de 2.500 ppm de TREO (óxidos de terras raras totais), superando a média mundial. Além disso, o aproveitamento na separação chega a 70%, quase o dobro do índice global.
Dois empreendimentos avançam na região: o Projeto Caldeira, da australiana Meteoric Resources, com 740 milhões de toneladas estimadas em uma área de 193 km²; e o Projeto Colossus, da Viridis Mining, com 201 milhões de toneladas em 228 km². Ambos os estudos cobrem apenas 15% da caldeira, cuja estimativa de volume total chega a 10 bilhões de toneladas de argila iônica, o que garantiria mais de 20 anos de atividade mineradora.
Segundo as mineradoras, os custos de produção devem ser os menores do mundo, em torno de US$ 6 por quilo. “Nosso projeto pode atender até 7% da demanda global de carbonato misto de terras raras a um custo altamente competitivo”, afirma Klaus Petersen, gerente da Viridis.

Amostra de argila retirada de área formada sobre cratera de vulcão extinto no Sul de Minas rica em elementos conhecidos por terras raras — Foto: Viridis/Divulgação
Sustentabilidade, recuperação e licenciamento
Diferentemente de outras operações, a extração em Poços de Caldas não exige detonação ou grandes escavações. A mineralização está na superfície, o que reduz impactos ambientais e os custos operacionais. A técnica utilizada é o backfill, em que o material tratado é reutilizado para preencher cavas já exploradas, em um processo contínuo de recuperação.
A extração envolve remoção da argila, lixiviação com solução diluída de sulfato de amônia, precipitação dos elementos, lavagem e reintegração do solo. O circuito é fechado, com 80% de reutilização da água e ausência de barragens. “A natureza já fez o trabalho de transformar a rocha em argila iônica. É o processo de mineração mais sustentável existente”, afirma o professor Roberto Galery, da UFMG.
Por outro lado, ambientalistas alertam para a ausência de estudos independentes sobre os riscos do retorno da argila tratada ao meio ambiente. “É essencial que os municípios da região realizem estudos próprios para avaliar possíveis efeitos à saúde e ao ecossistema”, defende Daniel Tygel, presidente da Aliança em Prol da APA da Pedra Branca.
As prefeituras de Caldas e Poços de Caldas afirmam que acompanham os processos de licenciamento e impactos socioambientais. Já Andradas e Águas da Prata, também na área da caldeira, ainda não possuem projetos em andamento.
Perspectivas para a cadeia produtiva

Laboratório de ímãs de terras raras é inaugurado pela Fiemg em Lagoa Santa, MG — Foto: Fiemg/Divulgação
O avanço dos projetos tem atraído investimentos estrangeiros e promete ampliar a arrecadação dos municípios mineradores. Pela legislação, 2% da receita bruta com a exploração mineral é repassada via CFEM, sendo 65% destinados aos cofres locais. Poços de Caldas pode arrecadar até R$ 23 milhões por ano, valor superior a toda a receita anual gerada pela mineração de bauxita e argila.
Apesar do potencial, o Brasil ainda enfrenta desafios para consolidar uma cadeia industrial nacional. O domínio chinês no setor inclui quase 75% da mineração global, 85% do refino e 95% da produção de ímãs. A meta brasileira é integrar desde a lavra até a fabricação de produtos de alto valor agregado, como os ímãs de Neodímio-Ferro-Boro (NdFeB), usados em motores e turbinas.
Nesse sentido, o governo federal inaugurou em maio o CIT SENAI ITR, laboratório com capacidade para produzir até 100 toneladas de ímãs por ano em Lagoa Santa (MG). Inicialmente, a matéria-prima será importada da China, mas o objetivo é utilizar futuramente o minério extraído em território nacional.
Fonte: G1