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Por Ricardo Lima
A Alta Corte da Inglaterra declarou, nesta sexta-feira (14), que a BHP é responsável pelo rompimento da barragem de Fundão, em Mariana (MG), com base na legislação ambiental e no Código Civil brasileiros.
A decisão afirma que a mineradora tinha conhecimento prévio do risco de ruptura e deixou de adotar medidas capazes de evitar a tragédia, que deixou 19 mortos e devastou 675 km de cursos d’água. O resultado é uma vitória para o escritório Pogust Goodhead, que representa as vítimas.
Corte aponta responsabilidade objetiva e risco previsível
Na sentença, a juíza Finola O’Farrell concluiu que a BHP incorreu em responsabilidade objetiva pelos danos causados pelo colapso da barragem. A magistrada afirmou que “a BHP é estritamente responsável como ‘poluidora’ pelos danos causados pelo colapso, nos termos dos artigos 3(IV) e 14 da Lei Ambiental”, destacando que para o tribunal, a legislação brasileira é suficiente para fundamentar a imputação de responsabilidade às controladoras da Samarco.
A juíza também ressaltou que o colapso poderia ter sido evitado, destacando que “o risco de colapso da barragem era previsível”, diante de sinais de instabilidade, falhas de drenagem e material saturado identificados antes de 2015. Em sua análise, O’Farrell ressaltou haver “provas esmagadoras” de que a instabilidade era conhecida pela BHP pelo menos desde agosto de 2014. Mesmo assim, a empresa não adotou medidas corretivas adequadas e continuou a elevar a barragem, atitude que, para a Corte, caracterizou negligência, imprudência e imperícia.
A decisão também rejeitou tentativas da mineradora de limitar sua responsabilidade e confirmou que o processo segue para a fase de avaliação dos danos, prevista para iniciar em 2026. Além disso, o tribunal confirmou que alguns acordos de indenização assinados no Brasil continuam valendo, o que reduz o número de pessoas que podem seguir com ações na Inglaterra.
A juíza também destacou evidências de que a BHP, ao lado da Vale, exercia controle sobre a Samarco de forma contínua, atuando como sua “mente diretiva”, influenciando decisões estratégicas e operacionais e assumindo a gestão dos riscos da barragem, o que reforçou o entendimento de que a empresa não poderia ser tratada como mera acionista passiva. Por fim, o Tribunal considerou que processos criminais no Brasil interromperam o curso do prazo prescricional, afastando qualquer barreira temporal e permitindo a continuidade das ações.
Escritório celebra vitória e fala em precedente global
A ação coletiva no Reino Unido reúne quase 600 mil atingidos e é conduzida pelo escritório internacional Pogust Goodhead, que vê o resultado como um marco para a responsabilização das empresas envolvidas na tragédia. Procurada pelo Minera Brasil após a divulgação da sentença, o escritório classificou o desfecho como uma “vitória histórica”, afirmando que o julgamento representa um avanço para vítimas que “há dez anos buscam a responsabilização efetiva”.
A CEO do escritório, Alicia Alinia, destacou o caráter global da decisão. “Esta decisão envia um recado claro para multinacionais no mundo todo. Não é possível ignorar o dever de cuidado e simplesmente se afastar da destruição causada. A responsabilidade está estabelecida. A BHP agora deve responder e pagar o que é devido”, afirmou.
Vale diz que responsabilidade será compartilhada
Em nota, a Vale afirmou que, embora a decisão da High Court seja dirigida à BHP, ela também repercute sobre a estrutura de responsabilização da Samarco, responsável pela operação da barragem e da qual a Vale é acionista. A companhia confirmou que o tribunal inglês considerou a BHP responsável pelo rompimento sob a legislação brasileira, e destacou que as quitações assinadas por pessoas já indenizadas no Brasil “reduzirão o número de reclamantes e o valor das demandas”.
A empresa também informou que, em julho de 2024, Vale e BHP firmaram um acordo confidencial prevendo o compartilhamento igualitário de eventuais condenações — seja da BHP, no processo inglês, ou da própria Vale, em litígio que tramita nos Países Baixos.
Segundo a nota, a Vale e a BHP “permanecem confiantes” de que o Acordo Definitivo firmado no Brasil, em outubro de 2024, no valor de US$ 32 bilhões, oferece “os mecanismos mais rápidos e eficazes para compensar os impactados”. A empresa diz que já foram destinados US$ 13 bilhões em reparação desde 2015, sendo mais de US$ 6 bilhões em indenizações e auxílios financeiros.
A mineradora afirma ainda que a reconstrução das comunidades atingidas está próxima da conclusão e que prevê uma provisão adicional de US$ 500 milhões em suas demonstrações financeiras de 2025, vinculada às obrigações decorrentes do desastre.
Municípios mantêm legitimidade para litigar na Inglaterra
A sentença também repercute no embate jurídico entre Brasil e Reino Unido ao confirmar a legitimidade dos municípios brasileiros para seguir com suas ações na Justiça inglesa. Hoje, 31 municípios integram o processo e, embora sua atuação tenha sido contestada pelas mineradoras no Supremo Tribunal Federal (STF), a High Court decidiu que eles têm direito de continuar litigando no Reino Unido.
Próximos passos
O caso agora avança para a etapa de avaliação dos danos. Uma audiência de gerenciamento está marcada para 17 e 18 de dezembro de 2025, e o julgamento da fase 2 deve ocorrer em outubro de 2026.
O processo tramita na Inglaterra porque a BHP era listada na Bolsa de Londres à época do desastre, permitindo que as vítimas buscassem reparação naquela jurisdição
Caso
O rompimento da barragem de Fundão ocorreu em novembro de 2015, liberando milhões de toneladas de rejeitos ao longo da bacia do Rio Doce e produzindo impactos socioambientais de larga escala. A ação tramita no Reino Unido porque a BHP, acionista da Samarco à época, era listada na Bolsa de Londres, o que permitiu que os reclamantes buscassem responsabilização também pela via da jurisdição inglesa.













