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por Fernando Moreira de Souza
Pesquisadores do Serviço Geológico do Brasil (SGB) identificaram granitos do tipo A no noroeste do Cráton do São Francisco, entre o sul do Piauí e o norte da Bahia. As rochas, datadas em aproximadamente 930 milhões de anos, oferecem pistas sobre a fragmentação do supercontinente Rodínia, ocorrida no Período Toniano.
As conclusões fazem parte do artigo “A-type Tonian granite in the Northwest of the Gavião Block: Record of within-plate magmatism precursor to the continental lifting of the São Francisco paleoplate?”, publicado na revista Journal of South American Earth Sciences. A pesquisa foi conduzida por José Alberto Rodrigues do Vale, do SGB, em colaboração com outros especialistas da instituição.
O estudo concentrou-se na Suíte Serra do Meio, um conjunto de granitos relacionados ao magmatismo intraplaca — processo que ocorre no interior das placas tectônicas, afastado de suas margens. Por meio de análises geoquímicas, petrográficas e datação isotópica U–Pb via SHRIMP, os pesquisadores confirmaram que as rochas foram formadas há cerca de 930 ± 2 milhões de anos.
Esses dados reforçam a hipótese de que os granitos estão associados a um rifte continental incipiente, o chamado Rifte Santo Onofre. Esse processo geológico não se completou, caracterizando um rift abortado. Segundo os autores, esse fenômeno pode ter sido um dos primeiros sinais da desagregação do supercontinente Rodínia.
Um dos aspectos inéditos do trabalho foi a detecção de magmatismo anorogênico do tipo A1 em uma região ainda pouco investigada. Tal ocorrência é relevante, uma vez que granitos desse tipo frequentemente contêm elementos raros, considerados estratégicos para setores de alta tecnologia, como baterias, ímãs e eletrônicos avançados.
Entender a formação e evolução desses granitos permite aos cientistas reconstruir eventos geodinâmicos que moldaram o Cráton do São Francisco, uma das principais províncias geológicas da América do Sul. Essa região é considerada fundamental para desvendar os processos que deram origem ao supercontinente Gondwana, o qual reuniu porções da América do Sul, África, Antártica, entre outros blocos continentais.
“A análise desses granitos contribui diretamente para o entendimento da história tectônica do Gondwana e da evolução do embasamento continental brasileiro”, explicou José Alberto do Vale, principal autor da pesquisa.
Projeto ARIM: base para novas descobertas
O trabalho foi desenvolvido com base em dados coletados entre 2018 e 2021 pelo Projeto Áreas de Relevante Interesse Mineral (ARIM), conduzido pelo SGB na região de São Raimundo Nonato (PI). Todos os levantamentos e análises foram executados por pesquisadores brasileiros, reforçando a capacidade científica nacional na investigação de recursos geológicos estratégicos.
Além do avanço no conhecimento geológico, os resultados também têm implicações práticas. A presença de granitos tipo A pode indicar potencial mineral relevante, abrindo caminho para estudos mais aprofundados voltados à exploração de recursos naturais.
Durante décadas, acreditava-se que granitos do tipo A surgiam exclusivamente em ambientes tectônicos distensivos — onde a crosta terrestre se afasta. Hoje, no entanto, já se reconhece que essas rochas também podem se formar em contextos compressivos, nos quais as placas colidem. Essa revisão de conceitos reforça o caráter dinâmico da geologia e o papel da ciência na reinterpretação contínua dos processos da Terra.