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Por Redação
Em pouco mais de quatro meses de operação, o Fundo Rio Doce já liberou aproximadamente R$ 1,6 bilhão. Sob gestão do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), esses recursos já estão fazendo a diferença para comunidades e moradores de dezenas de municípios de Minas Gerais e do Espírito Santo afetados pelo rompimento da barragem de Fundão. Os rendimentos obtidos na gestão do Fundo Rio Doce já superam R$ 250 milhões, ampliando os valores a serem destinados às ações de reparação. “Estamos comprometidos com as abordagens territoriais e interseccionais da população atingida, para contemplar as diferentes realidades e desafios que exigem soluções sob medida”, destaca Gabriel Visconti, superintendente da Área de Enfrentamento de Eventos Extremos e Gestão do Fundo do Rio Doce (ARD) do BNDES.
Nesta entrevista, Gabriel Visconti avalia as vantagens do novo modelo de reparação. Ele vê a experiência e a capacidade operacional do BNDES como um diferencial. Até o momento, já foram liberados recursos para o Programa de Transferência de Renda (PTR) a agricultores e pescadores, para fortalecimento da saúde e da assistência social e para custear atividades de assessorias técnicas independentes que prestam suporte aos atingidos. Através do Fundo Rio Doce, também serão viabilizadas medidas de fomento à educação, ciência e inovação; ações ambientais; projetos demandados pelas comunidades; entre outras iniciativas
1. Passados dez anos do rompimento da barragem de Fundão, uma nova governança para a reparação dos danos vem sendo implementada com a participação do BNDES. Sob gestão do Banco, o Fundo Rio Doce já liberou mais de R$ 1 bilhão desde que começou a operar em junho. Na visão do BNDES, quais as vantagens do novo modelo que contribuem para a superação de entraves que ainda persistem no processo de reparação?
GABRIEL VISCONTI: O rompimento da barragem de Fundão em 2015 gerou diversos e relevantes impactos socioeconômicos e socioambientais, afetando milhões de pessoas. Uma década após a ocorrência do desastre, muitos desses danos ainda não foram adequadamente reparados. Os efeitos ainda estão presentes no território.
A implementação do novo Acordo Judicial, em especial por meio do Fundo Rio Doce, objetiva a reparação integral dos danos socioambientais e socioeconômicos decorrentes do desastre. Essa reparação se dará por meio de ações projetos e medidas coordenadas por diferentes Ministérios e (contará) com a efetiva participação da população atingida em todas as suas etapas. A atuação do BNDES, no que couber, será pautada pela busca do desenvolvimento da região não apenas econômico, mas também social, cultural e ambiental.
2. De que forma a experiência acumulada pelo BNDES pode contribuir para uma melhor gestão dos recursos a serem destinados para a reparação dos imensos danos socioambientais causados pelo rompimento de uma barragem?
GABRIEL VISCONTI: O BNDES tem como missão promover o desenvolvimento socioeconômico e sustentável do Brasil e desempenha um papel estratégico na alocação eficiente de recursos voltados a essa finalidade. Ao longo de décadas, o Banco acumulou ampla experiência na execução de projetos relevantes para o país e na gestão de fundos com finalidades diversas. Entre eles, podemos destacar os fundos garantidores e o Fundo Amazônia. Essa experiência adquirida, em especial com o Fundo Amazônia, colaborou com o aperfeiçoamento das práticas de responsabilidade socioambiental do BNDES e trouxe diversos aprendizados que podem contribuir com a adequada execução dos recursos do Fundo Rio Doce. Podemos citar a importância da centralidade do diálogo, dos processos participativos contínuos envolvendo a população interessada, do fortalecimento do papel das organizações representativas e de suas capacidades institucionais e da governança compartilhada para legitimar escolhas e alinhar prioridades entre os variados atores. Também estamos comprometidos com as abordagens territoriais e interseccionais da população atingida, para contemplar as diferentes realidades e desafios que exigem soluções sob medida, observando suas particularidades.
Importante lembrar que o BNDES atuou de forma decisiva em ações emergenciais para mitigar impactos socioeconômicos decorrentes de calamidades e tragédias, como na pandemia de covid-19 e nas enchentes que atingiram o Rio Grande do Sul em 2024. O conhecimento acumulado nessas experiências amplia a capacidade do Banco de contribuir com a reparação dos atingidos pelo rompimento da barragem de Fundão. Por fim, cabe destacar que a atuação do BNDES é sempre pautada pela transparência e ampla divulgação de informações. Nesse sentido, o Banco criou em seu endereço eletrônico uma página específica para o Fundo Rio Doce que contempla a documentação relativa, informes financeiros e todas as decisões do Comitê Rio Doce, dentre outras informações.
3. A atual versão da Estratégia de Longo Prazo do BNDES fixa, como uma de suas diretrizes, a inclusão produtiva, rural e urbana de populações vulneráveis. Essa diretriz tem sido um dos principais norteadores para a gestão e os desembolsos do Fundo Rio Doce?
GABRIEL VISCONTI: Sabemos que os desastres tendem a agravar as vulnerabilidades da população atingida e a aumentar as desigualdades, ainda mais em um território marcado, entre outros aspectos, pelos legados racistas da escravidão negra e indígena, como é o caso de Minas Gerais e do Espírito Santo. Com a homologação do novo Acordo Judicial, apresenta-se uma nova oportunidade de se construir um processo de remediação transparente, que respeite os direitos dos atingidos e que garanta a sua participação efetiva em todo o processo, buscando corrigir os erros identificados na atuação da Fundação Renova.
A execução das ações deverá observar o disposto no Marco de Sendai, estabelecido pelo Escritório das Nações Unidas para Redução de Riscos de Desastres [UNDRR, na sigla em inglês] com o objetivo de prevenir novos riscos de desastres e reduzir os existentes. Esse marco estabelece que os processos de recuperação, reabilitação e reconstrução de desastres devem ser pautados pelo princípio “Build Back Better”, ou seja, devem ser considerados como uma oportunidade crucial para reconstruir melhor, inclusive por meio da integração de ferramentas de redução do risco de desastres com medidas de desenvolvimento das comunidades afetadas.
Como exemplo, podemos destacar que o Anexo 5 do Acordo Judicial estabelece o Programa de Incentivo à Educação, à Ciência, Tecnologia e Inovação, à Produção e de Retomada Econômica (“PRE”). No âmbito desse Programa, o Eixo Fomento Produtivo prevê a destinação de R$ 2 bilhões para ações dirigidas ao desenvolvimento econômico, à promoção de negócios geradores de renda e empregos e à melhoria da qualidade de vida das populações afetadas, em especial aquelas em situação de vulnerabilidade social. Outros R$ 2,5 bilhões, atrelados ao Eixo Rural, viabilizarão ações para revitalizar, reestruturar e impulsionar as atividades produtivas e ambientalmente sustentáveis dos agricultores familiares, produtores rurais, assentados de reforma agrária, quilombolas, silvicultores, extrativistas, incluindo outros povos e comunidades tradicionais com atuação laboral ou de subsistência na região.
4. A mitigação dos efeitos das mudanças climáticas e o apoio à transição energética também têm mobilizado esforços do BNDES. Essas agendas estão sendo consideradas na atuação do Fundo Rio Doce?
GABRIEL VISCONTI: Como exemplo de medidas relacionadas à mitigação dos efeitos das mudanças climáticas previstas no Acordo Judicial, cabe destacar o disposto em seu Anexo 17. Ele disciplina as ações ambientais da União Federal e prevê o valor de mais de R$ 8,1 bilhões para a implementação de ações compensatórias que promovam benefícios socioambientais à Bacia Hidrográfica do Rio Doce, bem como aos seus ecossistemas terrestres, marinhos e costeiros.
Essas ações incluem recuperação, conservação e uso sustentável da biodiversidade; promoção das cadeias de valor da bioeconomia; consolidação e gestão de florestas públicas, unidades de conservação e áreas protegidas; prevenção e combate aos incêndios florestais e apoio à fiscalização ambiental; restauração florestal e recuperação ambiental e conservação de água e solo. Também abrangem a gestão integrada de recursos hídricos e segurança hídrica; a proteção e conservação da fauna e flora, com especial atenção às espécies ameaçadas e às espécies aquáticas; e os estudos e ações relacionados ao gerenciamento da contaminação, avaliação de impactos, manutenção, recuperação, monitoramento e melhoria da qualidade ambiental da Bacia Hidrográfica do rio Doce.
Além disso, sob a ótica do objetivo de redução do risco da ocorrência de novos desastres, o Anexo 14 do Acordo Judicial destina R$ 1 bilhão para o fortalecimento das atividades de fiscalização, prevenção, mitigação e outras formas de atuação do Poder Público relacionadas aos riscos das atividades de mineração.
5. Neste marco de 10 anos do rompimento da barragem, que mensagem o BNDES traz para as populações atingidas que ainda esperam por uma efetiva reparação de danos?
GABRIEL VISCONTI: O acordo busca uma reparação ampla, justa e definitiva, com os recursos sendo direcionados principalmente para os atingidos, meio ambiente e retomada econômica. Transcorridos 10 anos do desastre, o compromisso do BNDES é trabalhar de maneira célere e eficiente, de modo a fazer com que esses recursos possam cumprir com os objetivos pactuados.
10 anos da tragédia de Marina
O colapso da estrutura, que integrava o complexo da Samarco Mineração S/A em Mariana (MG), completa 10 anos nesta quarta-feira (5). Mesmo após uma década completa, os danos socioambientais até hoje são sentidos ao longo da bacia do Rio Doce. As expectativas por soluções, no entanto, se renovaram com a assinatura de um novo acordo que alterou toda a governança das ações reparatórias. A criação do Fundo Rio Doce é parte dessa mudança. De outro lado, a Fundação Renova, organização de direito privada criada para atuar no modelo anterior de reparação dos danos, saiu de cena.
O novo acordo foi firmado no final de 2024 após mais de dois anos de negociações entre Samarco, suas acionistas Vale e BHP Billiton, a União, os estados de Minas Gerais e do Espírito Santo e instituições de Justiça como o Ministério Público e a Defensoria Pública. A mineradora se comprometeu com repasses adicionais que somam R$ 100 bilhões, com desembolsos parcelados ao longo de 20 anos. Parte dos recursos diz respeito à atribuição de estados, municípios e instituições de Justiça. O montante que cabe à União – um total de R$ 49,1 bilhões – está sendo aportado no Fundo Rio Doce, que será gerido pelo BNDES por 22 anos.













