fonte: O Fator
Em pelo menos dois momentos da história do Brasil, a mineração desempenhou um papel central em transformações que redefiniram o país. O primeiro ocorreu entre os séculos XVIII e XIX, quando a exploração do ouro impulsionou a ocupação do vasto território brasileiro. Além de fomentar o surgimento das chamadas “vilas do ouro”, o metal precioso enriqueceu Portugal, auxiliando a nação europeia a reduzir parte de sua considerável dívida com a Inglaterra.
No século XX, a extração de minério de ferro no Quadrilátero Ferrífero, no coração de Minas Gerais, foi fundamental para a consolidação da indústria siderúrgica brasileira. Sem esse recurso, o desenvolvimento industrial iniciado nos anos 1940, sob o governo de Getúlio Vargas e posteriormente impulsionado por Juscelino Kubitschek, não teria sido viável.
Agora, no século XXI, Minas Gerais se encontra no epicentro de uma nova revolução mineral, desta vez impulsionada pela transição energética rumo a uma economia de baixo carbono. Após o ciclo do ouro e do ferro, a atenção se volta para os chamados minerais estratégicos – entre eles, terras raras, nióbio e lítio. No último dia 22 de janeiro, o Ministério de Minas e Energia colocou em consulta pública as diretrizes para regulamentação desses recursos.
Esses três elementos são essenciais para viabilizar a adoção de energias limpas. Sem eles, a substituição dos motores a combustão por elétricos, bem como a fabricação de baterias para veículos eletrificados, seria inviável. Além disso, são indispensáveis para o funcionamento das turbinas eólicas, que convertem a força dos ventos em eletricidade.
Se, nos ciclos anteriores, as maiores jazidas estavam concentradas na Região Central de Minas, agora o panorama é diferente. O nióbio é encontrado em Araxá, no Triângulo Mineiro, na região Oeste do estado. As reservas de terras raras se localizam no extremo Sul e também em Araxá. Já o lítio se distribui pelo Vale do Jequitinhonha, no Nordeste de Minas, uma das regiões mais carentes do estado.
O desafio de agregar valor aos minerais estratégicos
O grande desafio associado aos minerais estratégicos é desenvolver um modelo de exploração que amplie cada vez mais o valor agregado à sua cadeia produtiva.
Terras raras impulsionam motores elétricos
As terras raras formam um grupo de 17 elementos químicos que receberam esse nome devido à sua baixa concentração na natureza. Apesar disso, são indispensáveis na vida moderna, melhorando a eficiência e o desempenho de dispositivos como smartphones, tablets e laptops. No setor de defesa, esses elementos são utilizados em sistemas de radar, mísseis e outras tecnologias militares. Além disso, estão presentes em telas de televisão, lâmpadas de LED e em processos industriais, como a refinação de petróleo.
Além dessas aplicações, as terras raras desempenham um papel crucial na substituição dos motores a combustão pelos elétricos. Nos motores elétricos, os ímãs permanentes produzidos com esses minerais são componentes essenciais, pois geram um campo magnético constante que interage com a corrente elétrica das baterias. Essa interação produz a força necessária para movimentar o motor.
Nos motores a combustão, esse papel cabe aos cilindros, que se deslocam impulsionados pela queima de combustíveis como gasolina, etanol ou diesel, ativando o mecanismo de rotação.
Entre os 17 elementos que compõem as terras raras, quatro se destacam na fabricação de ímãs permanentes – neodímio (Nd), praseodímio (Pr), samário (Sm) e cério (Ce). A demanda por esses materiais tem crescido significativamente, e o ímã de neodímio, em particular, é um dos mais potentes disponíveis no mercado.
A extração e o processamento das terras raras envolvem várias etapas complexas. O primeiro passo é o beneficiamento do minério, resultando na produção do carbonato misto de terras raras, que contém os 17 elementos combinados. Em seguida, esse carbonato passa por um processo de separação, gerando os óxidos de terras raras, que podem então ser comercializados individualmente conforme suas aplicações específicas.
Na terceira fase, os óxidos são transformados em ligas metálicas, utilizadas na fabricação de ímãs permanentes – o principal produto derivado das terras raras, assim como as baterias são para o lítio e o nióbio.
Atualmente, a China detém as maiores reservas conhecidas de terras raras, com 44 milhões de toneladas, seguida pelo Brasil, com 22 milhões de toneladas. O mercado global é amplamente controlado pelos chineses, que determinam os preços e impõem barreiras à transferência de tecnologia. Diante desse cenário, diversos países têm intensificado a busca por novas jazidas desses minerais estratégicos. No Brasil, Minas Gerais desponta como um dos principais polos de extração, com reservas significativas localizadas em Araxá e no Sul do estado, nas cidades de Poços de Caldas e Caldas.
O avanço australiano
Na disputa pelas terras raras de Minas Gerais, o capital australiano saiu na frente. Em Poços de Caldas, a Viridis Mineração e Minerais está em fase de implantação. Já na vizinha Caldas, opera uma unidade da Meteorics Resources, enquanto em Araxá funcionários da Saint George Mining marcam presença. As empresas Viridis e Meteorics concentrarão suas atividades exclusivamente na extração de terras raras, enquanto a Saint George atuará tanto nesse segmento quanto na exploração de nióbio, mineral abundante na região araxaense.
As jazidas de terras raras em Poços de Caldas possuem uma vantagem significativa em relação às norte-americanas. Diferentemente das reservas encontradas em rochas duras, os minerais dessa região estão depositados em argila iônica, o que simplifica consideravelmente o processo de separação dos elementos.
Em formações rochosas, a extração exige a detonação e moagem do minério, além do uso intensivo de ácidos em altas temperaturas, tornando a operação mais dispendiosa. Já nas terras raras contidas em argilas, a ação natural da chuva e do tempo ao longo de milhares de anos já promoveu a decomposição da rocha, facilitando a separação dos minerais e reduzindo custos.
Nesse aspecto, Minas Gerais se equipara à China, onde as terras raras também estão depositadas em argila. A semelhança, porém, termina aí. A produtividade das jazidas mineiras é muito superior à das chinesas. Enquanto na China uma tonelada de minério gera entre 700 e 800 gramas de terras raras, em Poços de Caldas a expectativa da Viridis é obter cerca de quatro quilos por tonelada, segundo seu diretor-executivo, Klaus Petersen.
Para reforçar o valor estratégico das jazidas da região, Petersen destaca a diferença nos custos de produção. Em uma mina de rocha dura, a obtenção de um quilo de terras raras custa entre US$ 35 e US$ 40. Já na Viridis, esse valor será de apenas US$ 7.
“É o melhor minério de terras raras do planeta”, afirma o executivo.
Fazendo uma analogia com Carajás, no Pará – onde a pureza do minério de ferro varia entre 60% e 70%, uma das maiores do mundo –, Petersen declara que a região de Poços de Caldas representa a “Carajás das terras raras”.
Perspectivas e investimentos
Atualmente, a Viridis finaliza os estudos ambientais necessários para solicitar formalmente a licença de exploração ao Conselho Estadual de Política Ambiental (Copam). A expectativa é que a autorização seja concedida dentro de um ano, possibilitando o início das operações em 2026.
Próxima à Viridis, mas situada em outro município, a Meteorics já está em uma fase mais avançada do cronograma. A previsão da empresa é obter a licença ambiental no primeiro trimestre de 2025. Inicialmente, seu plano era se limitar à primeira etapa de produção, fornecendo carbonato misto de terras raras para o mercado fora da China. No entanto, durante o processo de implantação, a estratégia mudou, e agora a empresa pretende avançar para a segunda etapa: a separação dos óxidos utilizados na fabricação de ímãs permanentes.
Marcelo Carvalho, diretor-executivo da Meteorics, revelou que a companhia já investiu US$ 80 milhões no projeto. O plano é aportar entre US$ 400 e US$ 500 milhões até o início da extração. Além disso, a construção de uma unidade de separação de óxidos poderá demandar investimentos adicionais de aproximadamente US$ 250 milhões.
Para Carvalho, o grande diferencial da exploração de terras raras está justamente na separação dos óxidos, etapa que representa um avanço significativo na cadeia de valor, abrindo caminho para a metalização dos elementos. O estágio final, a produção dos ímãs permanentes, é considerado essencial e deve envolver empresas especializadas em tecnologia, como a WEG e a Stellantis.
A Viridis, por sua vez, busca agregar ainda mais valor à sua operação. A empresa firmou uma parceria com a também australiana Ionics, que opera uma planta em Belfast, na Irlanda, dedicada à produção de óxidos a partir da reciclagem de ímãs. Combinando essa tecnologia com o carbonato misto extraído em solo mineiro, a Viridis planeja expandir sua atuação para a fabricação de ímãs permanentes.
Essa estratégia tem grande relevância para o Brasil, conforme ressalta Klaus Petersen. O motivo? A China está se movendo para interromper a venda de ímãs como produtos finais, comercializando-os apenas como componentes integrados em equipamentos fabricados no país.
Se uma montadora de automóveis precisar de um motor elétrico, por exemplo, a China fornecerá o ímã apenas se o motor for produzido em uma unidade fabril localizada em território chinês.
“Imagine o impacto global que essa política está causando”, comenta Petersen.
Ele, no entanto, enxerga na situação uma oportunidade única para o Brasil se consolidar como um player relevante no setor. De acordo com suas estimativas, quando as operações da Meteorics e da Viridis estiverem a pleno vapor, o país poderá responder por algo entre 10% e 15% da produção mundial de terras raras.
O que impulsiona o avanço australiano?
Vários fatores explicam o forte interesse dos australianos na exploração das jazidas brasileiras de terras raras. Um dos principais é a localização estratégica do Brasil em relação aos grandes centros consumidores — Estados Unidos e Europa —, enquanto a China, maior produtora global, supre sua própria demanda.
Essa vantagem logística reduz significativamente os custos de transporte, uma vez que a distância entre o Brasil e esses mercados é aproximadamente a metade da que separa a Austrália dos mesmos destinos.
Outro aspecto determinante é o custo da energia elétrica. No Brasil, o preço médio do quilowatt-hora gira em torno de quatro centavos de dólar, representando apenas um quinto do valor praticado na Austrália, o que torna a operação significativamente mais competitiva. Além disso, os trâmites para obtenção de licenciamento ambiental e a política de royalties sobre a mineração no Brasil também foram fatores considerados pelos investidores.
De acordo com Germano Vieira, advogado e ex-secretário de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável de Minas Gerais, que assessora a Viridis e a Meteorics no processo de licenciamento no Brasil, o tempo médio para obtenção de autorização na Austrália é de aproximadamente quatro anos — o dobro do necessário para um empreendimento minerário ser aprovado por aqui.
Um caminho já iniciado
Os investidores australianos não partiram do zero na corrida pelas terras raras brasileiras. Tanto na Meteorics quanto na Saint George, já existiam levantamentos iniciais indicando a presença desses minerais estratégicos.
No caso da Meteorics, a história começou com a família Togni, antiga detentora dos direitos minerários na região de Caldas. Durante anos, a argila local foi utilizada para a fabricação de refratários. No entanto, em 2012, um geólogo da família percebeu a semelhança entre a composição da argila da região e as argilas iônicas chinesas, levando à descoberta de um depósito significativo de terras raras.
A família Togni buscou então parcerias para explorar a jazida e chegou a negociar com uma estatal japonesa, que, diante das restrições impostas pela China à exportação desses minerais para o Japão, passou a buscar fornecedores alternativos. O acordo previa um pagamento antecipado de US$ 1,5 bilhão pelos direitos minerários em Caldas.
Entretanto, a pandemia de Covid-19 alterou os planos dos japoneses, que redirecionaram seus investimentos, optando por aportar US$ 150 milhões na Meteorics. Com isso, os australianos assumiram o controle dos direitos minerários que antes pertenciam à família Togni.
Já em Araxá, a Saint George teve sua origem em um trabalho inicial de prospecção conduzido pela canadense Itafos, especializada na produção de fertilizantes. A empresa considerava a exploração de jazidas de fosfato na região, um mineral amplamente presente no solo araxaense. No entanto, as análises revelaram uma concentração significativamente maior de nióbio e terras raras do que de fosfato.
Essa descoberta abriu caminho para os investidores australianos, que passaram a compartilhar a operação com a Itafos. A empresa canadense manteve uma participação no projeto, detendo 10% do capital da Saint George, que assumiu os direitos minerários da área.
Estratégia e perspectivas
A Saint George tem planos para explorar simultaneamente as jazidas de nióbio e terras raras em Araxá, com uma meta de produção anual de 20 mil toneladas desses minerais. Embora a quantidade de nióbio extraída seja um terço da produção de terras raras, o mineral desempenha um papel crucial na viabilidade econômica do projeto. De acordo com Thiago Amaral, diretor de Desenvolvimento Técnico da mineradora, a cotação do nióbio segue estável e elevada, enquanto o mercado de terras raras enfrenta oscilações.
Atualmente, a Saint George está em fase de pesquisa mineral, com o objetivo de avançar até a produção do óxido de terras raras, que será posteriormente comercializado para empresas responsáveis pela separação dos elementos conforme suas diversas aplicações industriais.
Laboratório com ‘DNA mineiro’
As empresas Saint George, Mosaic e Viridis integram o Laboratório de Produção de Ímãs de Terras Raras (LabFab ITR), uma iniciativa da Companhia de Desenvolvimento de Minas Gerais (Codemge) voltada para garantir ao Brasil o domínio da tecnologia de fabricação de ímãs permanentes.
Há um ano, o laboratório foi adquirido pela Federação das Indústrias do Estado de Minas Gerais (Fiemg) por R$ 35 milhões. A planta industrial já está equipada com quase todos os maquinários necessários para a produção, sendo que os equipamentos, importados da China, encontram-se na fase final de testes e ajustes.
O último componente essencial para o funcionamento do laboratório é um forno, também de fabricação chinesa, cujo processo de importação está em estágio avançado.
Segundo João Batista Ferreira Neto, coordenador do LabFab ITR, a previsão é que a produção em escala experimental tenha início em abril. A expectativa é fabricar anualmente cerca de 100 toneladas de ímãs de terras raras de alto desempenho.
Embora esse volume seja insuficiente para atender à demanda nacional, estimada em 10 mil toneladas por ano, João Batista destaca que o projeto representa um avanço estratégico para o país. Mais do que produzir terras raras como matéria-prima, o Brasil busca agora consolidar a separação dos óxidos e avançar até a fabricação dos ímãs permanentes.
“A ideia desse projeto é mostrar para o país que somos capazes de produzir da mina ao produto final”, ressalta o coordenador.
Perspectivas para o futuro
O LabFab ITR está no centro de um ecossistema formado por cerca de 20 empresas dos setores de mineração, indústria automotiva e fabricação de motores elétricos. Essas companhias estão diretamente envolvidas no projeto Rota 2030, que busca captar R$ 72 milhões para expandir o laboratório e transformá-lo em um centro de referência na produção de materiais magnéticos.
Caso o projeto não seja aprovado, o laboratório poderá assumir um papel estratégico como fornecedor industrial para clientes com demandas específicas e em volumes menores. Esse nicho de mercado, muitas vezes negligenciado pelos fabricantes chineses — que operam com exigências de compras em larga escala —, pode encontrar no LabFab ITR uma alternativa viável.
Atualmente, pedidos que fogem dos padrões estabelecidos pelos grandes fornecedores costumam ter prazos de entrega mais longos e custos elevados, o que pode dificultar a viabilidade para muitos compradores. Nesse contexto, a consolidação do LabFab ITR pode representar um passo fundamental para reduzir a dependência externa e fortalecer a autonomia brasileira na cadeia produtiva dos ímãs de terras raras.
A lição do nióbio
Enquanto o Brasil dá seus primeiros passos na exploração das terras raras, no caso do nióbio, o país já ocupa uma posição de destaque no desenvolvimento de produtos finais. Este mineral desempenha um papel essencial na transição energética, especialmente no aprimoramento das baterias, onde ele aumenta a estabilidade térmica e elétrica, garantindo um desempenho confiável mesmo em condições extremas.
As baterias com nióbio apresentam vantagens como a possibilidade de carregamento rápido, em questão de minutos, e uma vida útil superior às baterias convencionais. Seu uso é crucial para veículos elétricos, que exigem recarga eficiente, e em sistemas de geração de energia solar e eólica, já que essas baterias armazenam a energia produzida para ser utilizada quando não há sol ou vento.
O Brasil detém mais de 90% das reservas de nióbio no mundo, sendo a maior mina localizada em Araxá. A Companhia Brasileira de Metalurgia e Mineração (CBMM), de alcance global, é a principal produtora do mineral e está constantemente investindo no desenvolvimento de novas formas de utilizá-lo.
Parcerias estratégicas
A CBMM investe, em média, R$ 250 milhões anualmente em seu Programa de Tecnologia e Pesquisa (P&D). Desses, R$ 80 milhões são direcionados ao desenvolvimento de tecnologias para a produção de baterias, enquanto os outros R$ 170 milhões são usados para consolidar outras inovações com nióbio.
Uma das principais parcerias da CBMM nesse segmento é com a japonesa Toshiba. Em 2018, as duas empresas firmaram uma colaboração focada no desenvolvimento de baterias de lítio com ânodos compostos por óxidos mistos de nióbio e titânio, aumentando a eficiência e a durabilidade das baterias. Em 2021, a parceria foi expandida com a Volkswagen Caminhões e Ônibus, permitindo o teste dessa bateria em um ônibus, para o qual sistemas de gerenciamento térmico, energético e de carregamento ultrarrápido foram desenvolvidos.
Atualmente, a tecnologia está sendo testada em condições reais de operação. A CBMM está acompanhando esses testes para aplicar melhorias no protótipo e nas fases finais de desenvolvimento da bateria.
Em novembro, a CBMM colocou em operação uma nova planta industrial em Araxá, como parte de outra parceria estratégica que reforça a sinergia entre nióbio e lítio. A unidade é responsável pela produção de ânodos de nióbio para baterias de lítio, com capacidade de 3 mil toneladas anuais, sendo que 2 mil toneladas utilizam a tecnologia XNO, desenvolvida pela inglesa Echion Technologies. Esta empresa compra toda a produção da CBMM que usa a tecnologia XNO.
A tecnologia da Echion é aplicada em uma vasta gama de veículos e equipamentos, como ônibus urbanos elétricos, trens híbridos e elétricos, caminhões, máquinas de mineração, navios, veículos off-road, carros de alto desempenho e até mesmo robôs e equipamentos de movimentação de materiais, como aqueles usados em centros de processamento de dados e armazéns.
Lítio, o futuro da eletrificação
O lítio é um mineral de importância crucial para a transição energética devido a várias características excepcionais. Sua alta densidade energética permite que uma pequena quantidade de lítio armazene uma grande quantidade de energia, o que é fundamental para o desenvolvimento de baterias compactas e leves.
Outro atributo importante é o baixo peso, o que torna as baterias de lítio significativamente mais leves do que as de chumbo-ácido ou níquel-cádmio, tornando-as ideais para dispositivos portáteis e veículos elétricos. Além disso, as baterias de lítio têm uma longa expectativa de vida, o que garante muitos ciclos de carga e descarga antes de começarem a degradar, aumentando a durabilidade dos dispositivos.
Essas baterias também se destacam pela alta eficiência de carga, o que significa menor perda de energia durante o processo de recarga, um benefício crucial para o aumento da sustentabilidade.
As maiores reservas mundiais de lítio estão localizadas na Bolívia (49%), Chile (27,3%) e China (10%). O Brasil, embora não figure entre os maiores produtores, possui jazidas em municípios como Araçuaí e Itinga, no Vale do Jequitinhonha.
Até a década de 2010, o lítio era um mineral pouco comentado. Porém, com o crescimento da eletrificação veicular, o interesse pelo mineral explodiu. A Companhia Brasileira de Lítio (CBL), uma empresa nacional que explora pegmatito litinífero em Itinga e Araçuaí, se destacou nesse processo. Há 34 anos no setor, a CBL se consolidou também no beneficiamento do mineral, com uma unidade em Divisa Alegre, no Vale do Jequitinhonha.
A CBL opera de forma verticalizada: na unidade de mineração, o pegmatito litinífero é transformado em concentrado de espodumênio, que segue para o processamento químico, resultando em produtos como carbonato de lítio, hidróxido de lítio e sulfato de sódio anidro.
O carbonato de lítio possui três aplicações principais: na indústria cerâmica e metalúrgica (98,5% de pureza); na indústria farmacêutica, como tratamento psiquiátrico (99,5% de pureza); e na indústria de baterias, com o mesmo grau de pureza. Já o hidróxido de lítio (99,99% de pureza) é utilizado em usinas nucleares para a produção de energia elétrica.
Além desses produtos, a CBL também fabrica hidróxido de lítio monohidratado, usado em graxas e lubrificantes, e sulfato de sódio anidro, utilizado na produção de papel, vidro, couro e tecido.
Adequação aos novos tempos
Até 2016, a CBL atendia a toda a demanda nacional de lítio, incluindo o mercado de baterias, que ainda era limitado a eletrodomésticos e aparelhos celulares, representando menos de 1% da demanda total, de acordo com o CEO Vinícius Alvarenga. Com o boom da eletrificação veicular, a empresa precisou adaptar-se rapidamente.
A CBL quadruplicou a produção de concentrado de espodumênio e dobrou a produção de compostos químicos para atender à crescente demanda do setor de baterias. Alvarenga destaca que a transição foi tranquila, já que a companhia possuía o conhecimento necessário para atender às novas exigências tecnológicas.
Atualmente, cerca de 80% do faturamento da empresa, incluindo a mineração, provém do setor de baterias. O concentrado de espodumênio é exportado para a China, o único país que, além do Brasil, domina a tecnologia de processamento do mineral.
A CBL planeja expandir sua capacidade de produção, com projetos que visam aumentar a produção de concentrado de espodumênio de 45 para 90 mil toneladas por ano, e a produção química de 2 mil para 6 mil toneladas. No entanto, Vinícius Alvarenga adota cautela quanto ao início desses investimentos, dado o atual cenário de preços pressionados para baixo no mercado internacional.
Novos rumos para a mineração em Minas
A ascensão de minerais estratégicos, como lítio, está transformando a mineração em Minas Gerais. O governo estadual, atento ao grande volume de investimentos privados, mudou sua estratégia. A Companhia de Desenvolvimento de Minas Gerais (Codemge) deixou de atuar diretamente em empreendimentos e passou a fornecer informações estratégicas sobre o subsolo e as possíveis novas reservas.
Durante o governo de Fernando Pimentel (2015-2018), a Codemge adotou uma estratégia de participação societária. Porém, o atual governo de Romeu Zema (Novo) prefere uma atuação mais focada na oferta de dados geológicos, como mapas detalhados e levantamentos aerogeofísicos, que podem ajudar a mitigar riscos para novos projetos mineradores.
A Codemge oferece esses dados gratuitamente por meio de um portal, incluindo informações sobre o tipo de rocha, a idade das formações e os minerais presentes no subsolo, o que facilita a localização de novas reservas e fortalece o ambiente de negócios para a mineração.
Desenvolvimento e verticalização
A mineração em Minas Gerais, especialmente com o avanço do lítio, está criando uma nova dinâmica econômica no estado. O Sindicato da Indústria Mineral de Minas Gerais (Sindiextra) reconhece que os minerais estratégicos são fundamentais não apenas para a transição energética, mas também para gerar riqueza e empregos.
Vinícius Alvarenga, CEO da CBL, destaca que a verticalização da mineração é o principal objetivo da indústria. No entanto, ele ressalta que para que a verticalização ocorra de forma eficaz, é necessário mais do que um desejo; é preciso uma escala de produção que justifique esse modelo. Ele cita o exemplo do minério de ferro, sugerindo que, assim como o Brasil poderia produzir mais aço se investisse em infraestrutura e construção civil, a verticalização do lítio ocorrerá de forma natural à medida que a demanda por baterias aumente.
O futuro da mineração no Brasil, especialmente com minerais como o lítio, parece promissor, mas exige um planejamento cuidadoso e investimentos consistentes para garantir que o país aproveite seu potencial mineral de maneira sustentável e estratégica.
fonte: O Fator