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Por Ricardo Lima
A Aclara Resources Inc. anunciou que o governo dos Estados Unidos, por meio da U.S. International Development Finance Corporation (DFC), aprovou até US$ 5 milhões em financiamento para o desenvolvimento do Projeto Carina, localizado em Goiás. O recurso será aplicado principalmente no estudo de viabilidade da iniciativa, que deve ser concluído no primeiro trimestre de 2026. Em julho deste ano, a empresa havia iniciado conversas com o governo americano para apoio financeiro no projeto.
O aporte poderá ser convertido em participação acionária na empresa caso a Aclara consiga captar, em até 12 meses, mais de US$ 50 milhões em uma única rodada ou US$ 75 milhões em múltiplas rodadas de financiamento voltadas à construção do projeto.
O CEO da Aclara, Ramón Barúa, afirmou que o investimento da DFC é um reconhecimento da estratégia adotada pela companhia. “Este investimento inicial não é apenas uma validação da estratégia da Aclara, mas também um passo importante rumo a um compromisso maior da DFC assim que concluirmos o estudo de viabilidade do Projeto Carina”, destacou. Ele lembrou que o estudo já está em andamento e deve ser finalizado no início de 2026.
Barúa também ressaltou o peso geopolítico da parceria.
“O investimento evidencia a importância estratégica das terras raras pesadas para os Estados Unidos e a necessidade crítica de garanti-las a partir de fontes sustentáveis e confiáveis”
Ramón Barúa – CEO da Aclara Resources
Segundo ele, contar com a DFC como parceira ajuda a reduzir riscos no desenvolvimento do projeto no Brasil e fortalece a posição da Aclara como fornecedora de longo prazo para a cadeia de suprimentos ocidental.
O apoio da DFC ao Projeto Carina insere o Brasil em uma estratégia mais ampla dos Estados Unidos para reduzir sua dependência da China no fornecimento de terras raras. Atualmente, a China domina mais de 60% da produção global e cerca de 90% do refino desses elementos, essenciais para setores como defesa, energia renovável e tecnologia avançada. A escassez de capacidade de refino fora da Ásia tem levado países ocidentais a buscar alternativas confiáveis e ambientalmente responsáveis — e o Brasil, com suas reservas significativas, surge como um parceiro estratégico nesse reposicionamento global.
Estudo de viabilidade e início das operações
O estudo de viabilidade do Projeto Carina, conduzido pela empresa de engenharia Hatch Ltd., teve início em julho deste ano e dará continuidade ao pré-estudo programado para ser divulgado em setembro. A expectativa é de que o empreendimento entre em operação em 2028.
De acordo com a Aclara, a DFC terá prioridade para financiar ou atrair novos investimentos para a construção do projeto após a conclusão do estudo. O financiamento inicial não terá cobrança de juros e não exigirá garantias por parte da empresa.
Além da viabilidade econômica, o projeto também se destaca por seu alinhamento com critérios ESG, uma exigência crescente entre investidores internacionais. A Aclara incentiva uma cadeia de fornecimento que prioriza práticas sustentáveis e socialmente responsáveis, contrastando com os impactos ambientais frequentemente associados à mineração de terras raras em outras regiões.
Estratégia mine-to-magnet
O Projeto Carina faz parte da estratégia “mine-to-magnet” da Aclara, que busca estabelecer uma cadeia de fornecimento responsável de terras raras pesadas para o mercado global. Além do módulo brasileiro, a empresa desenvolve o Penco Module, no Chile, e uma planta de separação nos Estados Unidos.
A companhia também firmou parceria com a CAP S.A., no Chile, para a produção de ligas e metais de terras raras, e com a fabricante global Vacuumschmelze, para integrar esses materiais à produção de ímãs permanentes. Segundo a Aclara, o objetivo é se posicionar como uma das poucas cadeias de fornecimento totalmente compatíveis com critérios ESG no setor.
A verticalização da cadeia mine-to-magnet é um dos diferenciais da Aclara frente a concorrentes globais. Ao integrar desde a extração até a produção de ímãs permanentes — com módulos no Brasil e Chile e uma planta de separação nos Estados Unidos — a empresa reduz vulnerabilidades logísticas e geopolíticas. Essa estrutura é especialmente relevante diante das tensões comerciais entre China e EUA, que já resultaram em restrições à exportação de elementos críticos como disprósio e térbio. A consolidação dessa cadeia integrada posiciona a Aclara como uma das poucas alternativas ocidentais capazes de garantir autonomia tecnológica em setores estratégicos.
Diversificação estratégica da cadeia global
O investimento da DFC na Aclara ocorre em um contexto de mobilização internacional para reduzir a dependência da China no fornecimento de minerais críticos. A China ainda domina cerca de 90% do refino global de terras raras, o que representa um risco estratégico para países ocidentais em setores como defesa, energia renovável e tecnologia. Em resposta, os Estados Unidos têm adotado medidas para fortalecer cadeias de suprimento alternativas, apoiando projetos em países aliados e promovendo a verticalização da produção.
Nesse cenário, a mineradora australiana Lynas — maior produtora de terras raras fora da China — anunciou a captação de US$ 538 milhões por meio de oferta de ações, como revelou a Folha de S. Paulo, com o objetivo de expandir suas operações e adquirir participações em fabricantes de ímãs nos Estados Unidos. A empresa já opera minas na Austrália e uma refinaria na Malásia, e busca ampliar sua presença industrial em mercados ocidentais.
Embora os recursos sejam privados, a iniciativa se insere em um ambiente de forte incentivo governamental, que inclui ações como a aquisição, no mês passado, de uma participação direta do governo dos Estados Unidos na MP Materials, empresa sediada em Las Vegas Além disso, Washington estabeleceu um preço mínimo para terras raras, quase o dobro do valor de mercado, como forma de estimular a produção doméstica e reduzir a dependência da China.
Com projetos como o Carina, no Brasil, e a expansão da Lynas, o Ocidente busca consolidar uma rede de fornecimento de terras raras que seja segura, sustentável e geopoliticamente equilibrada. Países como Brasil, Austrália e Chile passam a ocupar posição estratégica na mineração mundial, contribuindo para a construção de cadeias industriais menos vulneráveis e alinhadas a critérios ambientais e sociais exigidos por investidores internacionais.