por Fernando Moreira de Souza
fonte: UOL
Com o objetivo de atrair investidores nacionais e internacionais, o governo talibã busca transformar a riqueza subterrânea do Afeganistão em uma fonte essencial de receita.
Estudos realizados pelos Estados Unidos e pela ONU em 2010 e 2013 revelam que, sob o solo rochoso do país, há esmeraldas, rubis, mármore, ouro e lítio, cujo valor é estimado em bilhões de dólares.
Apesar de décadas de conflito terem mantido esses recursos praticamente intocados, os talibãs, desde sua retomada do poder em 2021, já firmaram cerca de 200 contratos de mineração, no valor de bilhões de dólares, a maioria com empresas locais.
“Nosso objetivo é tornar o Afeganistão autossuficiente, mas enfrentamos desafios”, afirmou à AFP Humayoun Afghan, porta-voz do Ministério de Minas. “Faltam especialistas, infraestrutura e conhecimento técnico”, reconheceu.
Ele destacou, no entanto, que o governo está aberto a receber “qualquer investidor interessado, especialmente aqueles com experiência no setor de mineração”.
Dados do Serviço Geológico dos Estados Unidos (USGS) mostram que a produção de carvão, talco e cromo teve um crescimento significativo em 2021 e 2022, indicando um avanço inicial nesse setor.
Apesar do potencial, a falta de expertise e de infraestrutura adequada ainda representa um obstáculo para o pleno desenvolvimento da mineração no país.
O Ministério de Minas tem promovido licitações para projetos de exploração e extração, e, segundo o Banco Mundial, os resultados já são perceptíveis: um crescimento de 6,9% nas atividades de minas e pedreiras contribuiu para um aumento de 2,6% no setor industrial no período de 2023-2024.
No entanto, embora o governo tenha “leiloado diversos contratos menores de mineração para suprir suas necessidades financeiras, muitos desses acordos ainda não entraram em operação”, conforme destacado em um comunicado oficial divulgado em dezembro.
Javed Noorani, especialista em mineração, ressaltou que as autoridades licitaram “talvez dez vezes mais do que sua capacidade de execução”.
Os talibãs, que travaram uma insurgência de duas décadas contra o governo afegão apoiado pelos Estados Unidos e pela Otan, assumiram o controle do país em 2021, após a retirada das tropas estrangeiras.
Desde então, investidores internacionais deixaram o Afeganistão, apesar de a segurança ter melhorado significativamente. Muitos temem ser associados ao “Emirado Islâmico”, que não é reconhecido pela comunidade internacional e enfrenta sanções ocidentais.
Ainda assim, nações que mantêm relações com Cabul, como China, Irã, Turquia e Catar, têm aproveitado a oportunidade. “A primeira coisa que os investidores mencionam em nossas reuniões é que o país está mais estável e que estão interessados em investir”, afirmou Humayoun Afghan, porta-voz do Ministério de Minas. Ele estima que o setor de mineração gerou cerca de 150 mil empregos desde 2021.
Apesar dos avanços, os desafios persistem, especialmente no que diz respeito à capacidade de execução dos projetos e à atração de investimentos de maior escala.
Estado Islâmico. Um mineiro chinês foi assassinado em janeiro quando viajava pela província de Tajar, no norte do país.
A estatal chinesa MCC opera o depósito de cobre de Mes Aynak, o segundo maior do mundo, sob um contrato de 2008 restabelecido pelo governo talibã.
Outras empresas chinesas têm pelo menos mais três projetos de mineração, em especial em ouro e cobre, segundo Afghan.
Em uma montanha de Goshta, na província oriental de Nangarhar, extrai-se jade para a fabricação de joias. “A maioria da nossa nefrita vai para a China”, indicou Habibrahman Kawal, coproprietário da mina.
Apenas 14 empresas mineiras ativas operavam sob o governo anterior, segundo o britânico Centre for Information Resilience. “Isto sugere que há novas empresas dominando o setor de mineração no Afeganistão”.O governo se recusou a revelar os números de receitas do setor.
Shir Baz Kaminzada, presidente da Câmara de Indústrias e Minas do Afeganistão, assinalou que alguns investidores ignoram as sanções internacionais sabendo que “podem ganhar dinheiro”.
“Em um lugar como o Afeganistão, onde há pouquíssima experiência em mineração e muito poucas — se é que existem – regulamentações, isso é uma vantagem para as empresas que chegam”, assinalou o geofísico David Chambers, presidente de uma ONG que presta assistência técnica à mineração.
A situação permite trabalhar rapidamente, mas “pode causar dano ambiental ou econômico”, advertiu.
O principal perigo está nos resíduos da mineração, porque apenas 1% do que é escavado é removido.
Os restos poderiam conter sulfeto de ferro, que contaminam o solo ao entrar em contato com a água.
O Ministério de Minas diz aderir à legislação existente sobre a limpeza das minas, embora não tenha dado detalhes.
Chambers assinalou que tudo o que não é investido na limpeza “é lucro”, embora isso conduza a “potenciais custos de longo prazo”. Mas, no Afeganistão, admitiu Kaminzada, “as pessoas não se preocupam com o longo prazo”
Estado Islâmico e desafios na mineração afegã
Em janeiro, um mineiro chinês foi assassinado enquanto viajava pela província de Tajar, no norte do Afeganistão, em um incidente que destacou os riscos de segurança no país.
A estatal chinesa MCC, que opera o depósito de cobre de Mes Aynak — o segundo maior do mundo — sob um contrato assinado em 2008 e reativado pelo governo talibã, é uma das principais empresas atuantes no setor. Além disso, outras companhias chinesas estão envolvidas em pelo menos três projetos de mineração, principalmente focados em ouro e cobre, segundo Humayoun Afghan, porta-voz do Ministério de Minas.
Na província de Nangarhar, no leste do país, a extração de jade em montanhas de Goshta abastece o mercado de joias. “A maior parte da nossa nefrita é exportada para a China”, explicou Habibrahman Kawal, coproprietário de uma mina local.
Sob o governo anterior, apenas 14 empresas mineiras estavam ativas, de acordo com o britânico Centre for Information Resilience. “Isso sugere que novas empresas estão dominando o setor de mineração no Afeganistão”, observou a organização. O governo talibã, no entanto, se recusou a divulgar dados sobre as receitas geradas pelo setor.
Shir Baz Kaminzada, presidente da Câmara de Indústrias e Minas do Afeganistão, destacou que alguns investidores estão dispostos a ignorar as sanções internacionais, já que “veem oportunidades de lucro”.
David Chambers, geofísico e presidente de uma ONG que oferece assistência técnica à mineração, explicou que a falta de experiência e regulamentação no Afeganistão pode ser vista como uma vantagem para as empresas que chegam. “Em um lugar como o Afeganistão, onde há pouquíssima experiência em mineração e quase nenhuma regulamentação, as empresas podem operar com mais agilidade”, disse. No entanto, ele alertou que essa situação pode levar a danos ambientais e econômicos.
Um dos principais riscos está nos resíduos da mineração. Apenas 1% do material escavado é efetivamente aproveitado, enquanto o restante pode conter substâncias como sulfeto de ferro, que, em contato com a água, contaminam o solo.
O Ministério de Minas afirma seguir a legislação vigente sobre a limpeza das áreas de mineração, mas não forneceu detalhes sobre como isso é implementado. Chambers ressaltou que qualquer economia em medidas de limpeza pode se traduzir em lucro imediato, mas gera “custos potenciais de longo prazo”.
Kaminzada, por sua vez, admitiu que, no Afeganistão, “as pessoas não se preocupam com o longo prazo”. Essa mentalidade, combinada com a falta de regulamentação e fiscalização, pode comprometer não apenas o meio ambiente, mas também o desenvolvimento sustentável do setor de mineração no país.